sábado, 9 de abril de 2022

Documentos Históricos - Derrama e revolta popular na Inconfidência Mineira

 Derrama e revolta popular na Inconfidência Mineira

          É recorrente a hipótese de que, se a derrama fosse aplicada, haveria uma revolta popular em Minas Gerais. No entanto não é possível afirmar, uma vez que o Visconde de Ouro Preto suspendeu a aplicação dessa cobrança em 14 de março de 1789. No documento a seguir, o historiador Tarcísio de Souza Gaspar discute a validade dessa hipótese, considerando sobre quem cairia o maior fardo da arrecadação caso a derrama fosse aplicada.

         [...] Os historiadores idealizaram, ingênua e ideologicamente, que a derrama trouxesse consigo uma revolta popular. Porém, embora trágica e comovente, a visão peca por sua completa irrealidade. Inácio José de Alvarenga [um dos conjurados] era não só o maior proprietário de escravos, com 132 cativos, como o dono da maior fortuna (84:115$260 réis), dentre os presos condenados pela Alçada. Além disto, o conjurado mantinha, na região de Campanha do Rio Verde, numerosíssima clientela de “pés-rapados” [pobres, dependentes], por meio da qual pretendia dar início à revolta. Partindo destas informações, é forçoso imaginar que a derrama, como se apresenta em 1789, representasse uma onerosa dívida para o conjurado. [...] o abortamento da derrama não assinalou o anticlímax dos inconfidentes, mas, ao contrário, um profundo alivio financeiro para alguns deles – e também para toda a elite de Minas, escravista e patronal. Desta forma, vê-se que tal, como já advertira o historiador João Pinto Furtado, “o lançamento da derrama deve ter sido para alguns protagonistas de 1788-1789 não um pretexto, mas o motivo da revolta em si.

        [...] Embora o lançamento não tenha ocorrido de fato, impedindo a observação prática dos mecanismos de arrecadação, durante o período de suspense, entre julho de 1788 e março do ano seguinte, muita coisa foi imaginada pelos habitantes. Fizeram-se cálculos, propagaram-se boatos, previram-se valores e, ao cabo, forjou-se um imaginário próprio e singular sobre a cobrança. Sem dúvida, o assunto é mais complexo do que se pensou. Por um lado, é indubitável que o alto valor da derrama criara um impasse político. Caso fosse lançada, a cobrança poderia gerar algum tipo de distúrbio social? Talvez o verdadeiro problema resida no esclarecimento da natureza possível dessa crise.

          [...] Sob determinado aspecto, a derrama afetaria menos os pobres do que os ricos. [...] De qualquer maneira, é possível supor que o estrato empobrecido da população não seria o maior prejudicado. Muito questionável, portanto, se torna a convicção de que, por motivos econômicos, um levante popular estourasse.

GASPAR, Tarcísio de Souza. Topoi, vol. 11, n. 21, jul-dez, 2010, p. 67-68. Disponível em: <www.revistatopoi.org/numeros_anteriores/topoi21/Topoi21_04Artigo4.pdf>. Acesso em: 30 maio 2015.

Referências:

GASPAR, Tarcísio de Souza. Topoi, vol. 11, n. 21, jul-dez, 2010, p. 67-68. Disponível em: <www.revistatopoi.org/numeros_anteriores/topoi21/Topoi21_04Artigo4.pdf>. Acesso em: 30 maio 2015.

VICENTINO, Cláudio; VICENTINO, José Bruno. Projeto mosaico: história – anos finais (ensino fundamental), 8° ano. 1ª ed. São Paulo: Scipione, 2015. p. 79.

 

Fred Costa

 

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