Derrama e revolta popular na Inconfidência Mineira
É recorrente a hipótese de que, se a
derrama fosse aplicada, haveria uma revolta popular em Minas Gerais. No entanto
não é possível afirmar, uma vez que o Visconde de Ouro Preto suspendeu a
aplicação dessa cobrança em 14 de março de 1789. No documento a seguir, o
historiador Tarcísio de Souza Gaspar discute a validade dessa hipótese, considerando
sobre quem cairia o maior fardo da arrecadação caso a derrama fosse aplicada.
[...]
Os historiadores idealizaram, ingênua e ideologicamente, que a derrama
trouxesse consigo uma revolta popular. Porém, embora trágica e comovente, a
visão peca por sua completa irrealidade. Inácio José de Alvarenga [um dos
conjurados] era não só o maior proprietário de escravos, com 132 cativos, como
o dono da maior fortuna (84:115$260 réis), dentre os presos condenados pela
Alçada. Além disto, o conjurado mantinha, na região de Campanha do Rio Verde,
numerosíssima clientela de “pés-rapados” [pobres, dependentes], por meio da
qual pretendia dar início à revolta. Partindo destas informações, é forçoso
imaginar que a derrama, como se apresenta em 1789, representasse uma onerosa
dívida para o conjurado. [...] o abortamento da derrama não assinalou o
anticlímax dos inconfidentes, mas, ao contrário, um profundo alivio financeiro
para alguns deles – e também para toda a elite de Minas, escravista e patronal.
Desta forma, vê-se que tal, como já advertira o historiador João Pinto Furtado,
“o lançamento da derrama deve ter sido para alguns protagonistas de 1788-1789
não um pretexto, mas o motivo da revolta em si.
[...]
Embora o lançamento não tenha ocorrido de fato, impedindo a observação prática
dos mecanismos de arrecadação, durante o período de suspense, entre julho de
1788 e março do ano seguinte, muita coisa foi imaginada pelos habitantes. Fizeram-se
cálculos, propagaram-se boatos, previram-se valores e, ao cabo, forjou-se um
imaginário próprio e singular sobre a cobrança. Sem dúvida, o assunto é mais
complexo do que se pensou. Por um lado, é indubitável que o alto valor da
derrama criara um impasse político. Caso fosse lançada, a cobrança poderia
gerar algum tipo de distúrbio social? Talvez o verdadeiro problema resida no
esclarecimento da natureza possível dessa crise.
[...]
Sob determinado aspecto, a derrama afetaria menos os pobres do que os ricos.
[...] De qualquer maneira, é possível supor que o estrato empobrecido da
população não seria o maior prejudicado. Muito questionável, portanto, se torna
a convicção de que, por motivos econômicos, um levante popular estourasse.
GASPAR, Tarcísio
de Souza. Topoi, vol. 11, n. 21,
jul-dez, 2010, p. 67-68. Disponível em:
<www.revistatopoi.org/numeros_anteriores/topoi21/Topoi21_04Artigo4.pdf>.
Acesso em: 30 maio 2015.
Referências:
GASPAR,
Tarcísio de Souza. Topoi, vol. 11, n.
21, jul-dez, 2010, p. 67-68. Disponível em:
<www.revistatopoi.org/numeros_anteriores/topoi21/Topoi21_04Artigo4.pdf>.
Acesso em: 30 maio 2015.
VICENTINO,
Cláudio; VICENTINO, José Bruno. Projeto
mosaico: história – anos finais (ensino fundamental), 8° ano. 1ª ed. São
Paulo: Scipione, 2015. p. 79.
Fred Costa
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