Os agudás
Leia o trecho de um artigo a seguir
sobre os agudas:
Em
janeiro, as tradicionais homenagens a Nosso Senhor do Bonfim em Salvador ecoam
do outro lado do Atlântico, deixando ainda mais claro os laços culturais que há
séculos aproximam a Bahia da África. No Sul do Benin, homens e mulheres vestem
uma faixa verde e amarela sobre o peito e seguem rumo a missas para o
padroeiro, cerimônias cristãs formais que são acompanhadas por cortejos
carnavalescos pelas ruas de cidades como Uidá e Porto-Novo. Identificado como
Oxalá (o orixá criador da humanidade) no candomblé baiano, o Senhor do Bonfim é
um elo entre dois mundos físicos e espirituais, separados por um oceano e
marcados pelo estigma da escravidão. A devoção tem causa nobre: à África nos
séculos 18 e 19, tal viagem de volta à terra natal significava um “bom fim”, um
bom destino.
O
culto a um santo católico é um dos traços marcantes dos “brasileiros” que
habitam a faixa costeira do Benim, do Toga e da Nigéria. Os agudas, como são
conhecidos – a palavra deriva de “ajuda”, nome português da cidade de Uidá,
movimentado entreposto negreiro da África ocidental no passado -, integram
famílias que descendem de escravos e de comerciantes baianos lá estabelecidos
no auge do tráfico humano entre os dois continentes. Possuem sobrenomes como
Souza, Silva, Medeiros, Almeida, Aguiar, Campos, entre outros, dançam a “burrinha”,
uma versão arcaica do bumba meu boi, e se reúnem nas festas ao redor de uma feijoada
ou de um kousidou. Não raro, os agudás mais velhos se saúdam com um singelo “Bom
dia, como passou?”, e a resposta não demora: “Bem, brigado”.
“O
português chegou a ser língua franca no Benin na época da implantação da
administração colonial francesa”, observa o antropólogo Milton Guran,
pesquisador do Laboratório de História Oral e imagem da Universidade Federal
Fluminense, no Rio de Janeiro, em seu livro da Missão Católica de Lyon, que se
estabeleceu em Uidá em 1862, ensinava em português aos filhos dos retornados,
que levaram para a África negra aspectos da cultura ocidental, como técnicas de
arquitetura e engenharia (a alvenaria), festas religiosas, hábitos alimentares
(a mandioca, o doce de coco), organização familiar patriarcal e uso de
sobrenomes. “A presença brasileira foi tão marcante nesse trecho da costa
africana entre os séculos 18 e 19 que poderíamos falar de uma colonização
informal”, analisa Guran. “É exemplo único de implantação de uma cultura
brasileira – no caso, a baiana – fora de nossas fronteiras”.
Para
os governantes do reino do Daomé (antigo nome do Benin), o comércio de cativos
era um projeto econômico oficial, de desenvolvimento e fortalecimento de um
Estado. Esse ambiente foi favorável à chegada de brasileiros dispostos a
trabalhar como negreiros, entre os quais o lendário Francisco Félix de Souza. Filho
de índia com português, Souza nasceu na Bahia, em 1754, e desembarcou no Daomé,
acredita-se, em 1788. Escrivão e contador do Forte São João Batista de Ajuda,
em Uidá, logo tornou-se mercador influente – dependia dele a entrada ao reino
de produtos como pólvora, fuzis, cachaça – e galgou a aura de mito nos relatos
de viagem da época, alardeado por manter 2 mil escravos em seus barracões
[...].
RIBEIRO, Ronaldo.
Os agudas. Disponível em:
<viajeaqui.abril.com.br/matérias/agudas-africa-brasil#8>. Acesso em: 26
mar. 2015.
Referência:
RIBEIRO,
Ronaldo. Os agudas. Disponível em:
<viajeaqui.abril.com.br/matérias/agudas-africa-brasil#8>. Acesso em: 26
mar. 2015.
VICENTINO,
Cláudio; VICENTINO, José Bruno.Projeto
mosaico: história – anos finais (ensino fundamental), 7° ano. 1ª ed. São Paulo:
Scipione, 2015. p. 294.
Fred Costa