Escravidão doméstica
[Nos] confrontos era comum que os
vitoriosos fizessem alguns escravos dentre os membros de um vilarejo vencido em
luta armada. Era a chamada escravidão doméstica, que consistia em aprisionar
alguém para utilizar sua força de trabalho, em geral, na agricultura de pequena
escala, familiar. Se a terra era abundante, mas rareava mão de obra, esse tipo
de escravidão servia para aumentar o número de pessoas a serem empregadas no
sustento de uma família ou grupo. [...] Os escravos eram poucos por unidade
familiar, mas a posse deles assegurava poder e prestígio para seus senhores, já
que representavam a capacidade de autossustentação da linhagem. Não por acaso,
nesse tipo de cativeiro se preferiam mulheres e crianças. A fertilidade das
mulheres garantia a ampliação do grupo. Daí que era legítimo as escravas se
tornarem concubinas e terem filhos com os seus senhores.
Seguindo a mesma lógica, a
incorporação dos escravos na família se dava de movo gradativo: os filhos de
cativos, quando nascidos na casa do senhor, não podiam ser vendidos e seus
descendentes iam, de geração em geração, perdendo a condição servil e sendo
assimilados à linhagem. Assim o grupo podia crescer com o nascimento de
escravos, fortalecendo as relações de parentesco e aumentando o número de
subordinados ao senhor. A integração dos cativos também explica a predileção
pela escravização de crianças, visto que elas mais facilmente assimilavam
regras e constituíam vínculos com a família do seu senhor. Não era só na guerra
que se corria o risco de ser escravizado. Em muitas sociedades africanas, o
cativeiro era a punição para quem fosse condenado por roubo, assassinato,
feitiçaria e, às vezes, adultério. A penhora, o rapto individual, a troca e a
compra eram outras maneiras de se tornar escravo. As pessoas podiam ser
penhoradas como garantia para o pagamento de dívidas. Nesta situação, caso seus
parentes saldassem o débito, extinguia-se o cativeiro. Tais formas de aquisição
de cativos foram mais ou menos comuns em diferentes períodos e lugares da
África. O rapto e o ataque a vilas se tornaram mais freqüentes quando o tráfico
de escravos tomou grandes proporções. El algumas sociedades, a exemplo do povo
Sena de Moçambique, a escravidão também era uma estratégia de sobrevivência
quando a fome e a seca se faziam desastrosas. A venda ou troca de um indivíduo
da comunidade podia garantir sobrevivência do grupo, inclusive de quem era
escravizado. A troca de alguém por comida era uma forma de evitar a extinção do
grupo. Certamente estamos falando de um recurso extremo, porque ser escravo
naquelas sociedades tão fortemente estruturadas por laços de parentesco
significava ser exilado, tornar-se um estrangeiro muitas vezes tendo que
professar outra fé, se comunicar em outro idioma, estar alheio às suas
tradições. Sentenciar alguém à escravidão era acima de tudo desenraizá-lo e
desonrá-lo.
Desde que os árabes ocuparam o Egito
e o norte da África, entre o fim do século VII e a metade do século VIII, a
escravidão doméstica, de pequena escala, passou a conviver com o comércio mais
intenso de escravos. A escravidão africana foi transformada significativamente
com a ofensiva dos muçulmanos. Os árabes organizaram e desenvolveram o tráfico
de escravos como empreendimento comercial de grande escala na África. Não se
tratava mais de alguns poucos cativos, mas de centenas deles a serem trocados e
vendidos, tanto dentro da própria África quanto no mundo árabe e,
posteriormente, no tráfico transatlântico para as Américas, inclusive para o
Brasil.
ALBUQUERQUE,
Wlamyra R. de; FRAGA FILHO, Walter. Uma
história do negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro-Orientais;
Brasília: Fundação Cultural Palmares, 2006. p. 14-15.
Referências:
ALBUQUERQUE,
Wlamyra R. de; FRAGA FILHO, Walter. Uma
história do negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro-Orientais;
Brasília: Fundação Cultural Palmares, 2006.
VICENTINO,
Cláudio; VICENTINO, José Bruno. Projeto
mosaico: história – anos finais (ensino fundamental), 7° ano. 1ª ed. São
Paulo: Scipione, 2015. p. 280.
Fred Costa
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